Exceto que o planeta vai se curvar tanto. Deve quebrar em algum ponto. Salgado, que passou a maior parte de seu primeiro ato como fotógrafo, registrando o fim da revolução industrial global, dedicou o segundo a capturar o que ainda poderia ser perdido se a urbanização, o consumo desenfreado, as mudanças climáticas e a indiferença social fossem deixados descontrolados.
Aos setenta anos, Salgado não desiste, focando suas lentes no maior tesouro de seu país: a Amazônia. Segundo sua editora, este pode ser o último projeto dessa escala que o venerável brasileiro está empreendendo.
“Estamos apresentando uma Amazon diferente”, diz CNN. “Não há incêndios, não há destruição – a Amazônia que deve permanecer lá para sempre”.
Serra do Marauiá, em São Gabriel da Cachoeira, Estado do Amazonas, 2018. A serra está localizada no Território da Habitação Yanomami, com mais de 9,6 milhões de hectares. Crédito: © Sebastião Salgado
Salgado se aventurou na Amazônia desde os anos 1980, cultivando relacionamentos com algumas das 188 tribos apenas no Brasil, ele escreve no livro. Para alguns, como os Yanomami, ele volta por décadas enquanto goza de acesso privilegiado a outros, tornando-se o primeiro não indígena a visitar todas as aldeias do povo Zo’é, diz Salgado. Para “Amazon” ele passou nove anos e 48 viagens, desaparecendo na floresta por semanas, às vezes meses, voltando com novas histórias e um senso de comunidade. “Quando viemos trabalhar com essas tribos, voltamos para casa”, diz ele.
A Odisséia de Sebastião Salgado na Amazônia
Embora a Amazônia em suas fotos pareça intocada, Salgado lamenta a floresta tropical que já foi perdida. “Há muito tempo construímos nossa sociedade com recursos naturais. Nós o destruímos “, diz ele. “Temos que proteger o que não destruímos. Temos que ser inteligentes o suficiente para sobreviver. “
O povo amazônico “vive em total comunhão, em total paz com o meio ambiente”, diz Salgado. Eles também podem oferecer lições: ao mesmo tempo em que descreve as tribos como “a pré-história da humanidade”, também descreve cada uma como um “futuro” em potencial para o planeta.
“Não podemos construir nosso futuro – o futuro da humanidade – com base apenas na tecnologia”, acrescenta. “Temos que olhar para o nosso passado; devemos considerar tudo o que fizemos em nossa história. O ser humano tem uma grande oportunidade: a pré-história da humanidade está agora na Amazônia.
Luísa, do povo Asháninka, pinta o rosto no espelho. Fotografado em 2016. Território indígena Kampa do Rio Amônea, estado do Acre. Segundo Salgado, os registros dos habitantes Asháninka remontam aos laços econômicos e culturais com o Império Inca nos séculos XV e XVI. Crédito: © Sebastião Salgado
Quando se trata de ecologia, Salgado não pode ser censurado por conversa fiada. Ao longo dos anos, ele praticou o que pregava por meio do Instituto Terra, centro que fundou com sua esposa Lélia. Ele admite que o sítio na Mata Atlântica, no sudeste do Brasil, costumava ser a fazenda de gado de seus pais, e que o pasto se tornou um “deserto” ecológico. Desde 1999, o casal e sua crescente equipe de trabalhadores plantaram mais de 3 milhões de árvores cobrindo 300 espécies e observaram a inundação da vida selvagem. “Foi uma espécie de milagre”, diz ele. “Com árvores, insetos, mamíferos, todo tipo de pássaro, todo tipo de vida ele retornou.”
Mais de 700 hectares foram totalmente arborizados e o trabalho do instituto está ajudando a recuperar cerca de 2 mil nascentes da Mata Atlântica. Salgado diz que o modelo é tão importante para o Brasil quanto para a Califórnia, atingida pela seca: “Temos que reconstruir a fonte de água; uma maneira é plantando árvores. ”
“Podemos reconstruir o planeta que destruímos, e devemos”, acrescenta.
Mas, apesar de todos os aspectos positivos que emergem de suas fotos, Salgado permanece ambivalente sobre seu poder. “Não acredito que as fotos possam mudar alguma coisa”, diz ele. “A imagem em si é apenas algo para se ver.” Mas, no caso da Amazônia, diz ele, vinculá-los ao trabalho de instituições ambientais pode “desencadear um movimento”.
Este momento é muito urgente. Na introdução do livro, o fotógrafo expressa seu desejo sincero de que “em 50 anos este livro não se pareça com o registro do mundo perdido”.
Ao publicá-lo, em mais de uma maneira, ele faz tudo ao seu alcance para evitar que isso aconteça.